APOSENTADORIA AOS 65 ANOS- SÓ QUER QUEM NUNCA TRABALHOU EM CARVOARIAS E CARREGANDO CIMENTO.
OPINIÃO:
“QUEM QUER APOSENTADORIA AOS 65 ANOS NUNCA CORTOU CANA OU CARREGOU
CIMENTO”
Normalmente quem defende a
imposição da idade mínima de 65 anos para aposentadoria somos nós, jornalistas,
cientistas sociais, economistas, administradores públicos e privados,
advogados, políticos.
Afinal de contas, o que são 65 anos
para nós, que trabalhamos em atividades que nos exigem muito mais
intelectualmente?
Diante da incapacidade de se
colocar no lugar do outro, do trabalhador e da trabalhadora que dependem de sua
força física para ganhar o pão, no campo e na cidade, esquecemos que seus
corpos se degradam a uma velocidade muito maior que a dos nossos.
Ou seja, a menos que tenham tirado
a sorte grande na loteria da vida, eles tendem a ter uma vida mais curta (e
sofrida) que a nossa. No Maranhão, a média da expectativa de vida masculina é
de 66 anos.
Já fiz esse debate por aqui, mas
quero retomá-lo por conta da notícia de que o governo federal quer priorizar as
mudanças no INSS entre todas as reformas que pretende tocar.
''Eu pessoalmente, e penso que falo
em nome do presidente Temer, penso que nós não devemos nesse momento trazer
para um debate mais amplo nenhum tema que não seja a reforma fiscal e a reforma
da Previdência'', afirmou o ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, nesta
segunda (12). ''Penso que nós vamos centrar fogo neste momento até nós
conseguirmos aprovar essas duas reformas, que são fundamentais para o Brasil.''
Você que está, neste momento,
fazendo mimimi para isso, provavelmente não costuma carregar sacos de cimento
nas costas durante toda uma jornada de trabalho, cortar mais de 12 toneladas de
cana de açúcar diariamente, queimar-se ao produzir carradas de carvão vegetal
para abastecer siderúrgicas e limpar pastos ou colher frutas sob um sol
escaldante.
Carvoaria em Minas Gerais. Foto:
João Roberto Ripper
Ou, se teve uma vida com essas
provações e, mesmo assim, concorda com os doutores que defendem essa mudança em
nome dos cofres públicos, achando que ''quem quer se aposentar antes dos 65 é
vagabundo'', parabéns. Você consegue, como ninguém, exercer o papel de cão de
guarda do capital alheio.
Aos 14 anos, muitos desses
trabalhadores já estavam na luta e nem sempre apenas como aprendizes, como
manda a lei. Às vezes, começaram no batente até antes, aos 12, dez ou menos.
Afinal, no Brasil, acredita-se que o ''trabalho molda o caráter da criança''.
Os sábios que estão discutindo no
Ministério da Fazenda a questão da imposição da idade mínima como requisito,
além, é claro, do tempo de contribuição e/ou de serviço, deveriam ter que
explicar a proposta, cara a cara, para um grupo de cortadores de cana ou de
pedreiros.
Sem meias palavras, sem enganações.
Se sair inteiro de lá, pode tocar.
O ideal seria, antes de fazer uma
Reforma da Previdência Social, garantirmos a qualidade do trabalho no Brasil,
melhorando o salário e a formação de quem vende sua força física,
proporcionando a eles e elas qualidade de vida – seja através do
desenvolvimento da tecnologia, seja através da adoção de limites mais rigorosos
para a exploração do trabalho. O que tende a aumentar, é claro, a
produtividade.
Mas como isso está longe de
acontecer (basta ver a ''vida'' dos empregados de frigoríficos em todo o país,
que são aposentados por invalidez aos 30 e poucos anos por sequelas deixadas
pelo serviço), a discussão talvez passe por um regime diferenciado para
determinadas categorias. E, mesmo assim, não será simples, pois em algumas
delas os profissionais são levados aos limites e aposentados por danos
psicológicos – ou chegam aos 60 sem condições de desfrutar o merecido descanso.
Há milhões de pessoas, fundamentais
para o crescimento do país, que se esfolam a vida inteira e não devem ser
deixadas na beira da estrada quando deixarem a população economicamente ativa.
Infelizmente, o governo federal
acha que o Brasil é um grande escritório com ar condicionado.
Leonardo Sakamoto
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